Existem tantas histórias dentro de nós
Só me atrevo a contar esta história porque a mesma foi contada
há pouco tempo, numa reportagem que passou na RTP2:
Que vontade que eu tinha de escrever sobre algo tão bonito
mas quando contamos histórias ao mundo temos o dever de respeitar os
intervenientes, a sua privacidade e a sua vida pessoal. É obrigação de que
conta histórias só contar as suas, respeitando sempre a linha que separa a
vontade que temos de as contar para a privacidade a que todos temos direito.
Esta é uma história muito bonita, de amor incondicional.
Existem em Portugal inúmeros bons corações, daqueles que
agem sem se saber, dando tudo o que possuem para fazer os outros felizes e sem
nada receber em troca a não ser o prazer de missão cumprida. Sabemos pouco
sobre eles, eventualmente vemos uma reportagem ou lemos um artigo e pouco mais.
De entre estes bons corações, existe uma equipa fantástica de
médicos e enfermeiros em Portugal (entre muitas outras) que todos os anos se
junta e voam até à Guiné Bissau, numa missão humanitária extraordinária,
passando os seus dias e noites a operar para salvar vidas. Pouco se fala do que
fazem mas fazem-no muito bem feito, ajudando a sobreviver ou a ter melhores
condições um povo que se sente tão abandonado e que precisa de tudo,
especialmente de cuidados médicos.
Há anos que acompanho dentro da minha vidinha confortável as
aventuras destes heróis, os sacrifícios da sua vida pessoal e a sua entrega
total aos outros, algo que hoje em dia tende a escassear e que nos faz contudo
tanta falta. Sinto-me pequena quando oiço as suas histórias pois a simplicidade
é avassaladora, tal como a missão que adotaram para a sua vida.
Todos os anos esta equipa reúne medicamentos e outros
materiais necessários e ruma à Guiné Bissau. É que enviar um doente para Portugal
para ser tratado custa muitos milhares de euros e este país está muito longe de
ter capacidade financeira para este tipo de investimentos.
Assim, num local onde não existe quase nada, não falta o
amor. Os portugueses chegam e logo, devido à palavra que passa de boca em boca,
o hospital se enche de pacientes à procura de ajuda para tratarem as suas
maleitas.
Há muitos anos atras foi numa destas ações que a equipa se
deparou com um menino em estado de coma, levado para morrer no hospital. Foi
sem dúvida o amor e o carinho que o trouxe de volta ao mundo pois medicação é
algo que não abunda por ali. Uma enfermeira em particular dedicou-se de coração
a salvar esta criança, falando com ele, nunca desistindo, apesar de
aparentemente ele já parecer desligado desta vida.
O Kabi renasceu no dia em que acordou de coma, aos gritos, a
chamar pelo nome a enfermeira que nunca tinha desistido dele. Miraculosamente e
contra tudo o Kabi salvou-se e começou neste dia uma nova vida.
Passados muitos anos este menino é já um homem, estuda para
ir mais além numa terra onde a esperança parece ter partido para outras terras
mais felizes.
Durante todos estes anos o Kabi tem vindo a Portugal nas férias
grandes e foi assim que este menino me “caiu no colo” literalmente por mero
acaso. Ajudando no que podia, depois de conhecer a grandiosidade de quem a
ajuda, fui ao longo destes anos fazendo muito pouco mas tentando fazer o melhor
possível. Todo este tempo sempre à distância pois o Kabi vem a Portugal passar
todas as férias de verão mas nunca nos conhecemos.
Este ano finalmente, agora que o menino já é um homem, tive
o prazer de lhe dar um abraço e de o olhar nos olhos. Vim um coração cheio,
reconhecido e em paz. Este menino salvou-se, agora vamos ter esperança porque
se certeza que um futuro brilhante espera por este homem.
Se não for antes, no dia da sua formatura, adorava estar na
primeira fila a vê-lo receber o seu diploma, na Guiné Bissau.
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