Como é árido o Tarrafal
Como é árido o Tarrafal, como se tivesse de ser sempre assim,
seco e duro, para que a memoria nunca se esqueça de outros tempos ainda mais
secos e duros.
Árido e seco, seco e duro, mesmo não havendo presos a dor
ficou para sempre colada às paredes, todas elas também áridas e duras.
Como é árido o Tarrafal, de uma calma secura que se entranha.
Parece que por aqui os presos, a dor e o desalento fizeram as pazes com o
futuro, deixaram a aridez mas levaram a dor nas asas das pombas que sobrevoam o
campo.
Árido e seco, sem sombra e sem água e no entanto no meio de
um clima tão agreste brincam crianças alegremente, mostrando a quem por ali
passa que o futuro é promete.
Como é árido o Tarrafal, de paredes envelhecidas e
recordações ainda recentes, como fotos e historias a dar vida a uma realidade
que não deve ser esquecida.
O Tarrafal
O Tarrafal, ou Colonia Penal do Tarrafal, foi criada pelo
governo português do Estado Novo, na ilha de Santiago (Cabo Verde), mais propriamente
no lugar de Chão Bom.
O campo de concentração começou a funcionar em Outubro de 1936,
tendo permanecido ativo até 1954, altura em que foi encerrado devido a pressões
internacionais fruto do período pós Segunda Guerra, em que as marcas dos campos
de concentração eram muito profundas a nível mundial.
Foi reaberto em junho de 1961, sob a denominação de Campo de
Trabalho de Chão Bom, para encarcerar resistentes à guerra colonial tendo sido
definitivamente encerrado no dia 01 de maio de 1974.
Este campo também ficou conhecido como o «Campo da Morte
Lenta». Este nome deve-se à conhecida «frigideira», um espaço para onde eram
enviados os presos e que atingia temperaturas elevadíssimas. A «frigideira» de
cimento com os seus 60 graus de temperatura já não existe.
O Campo do Tarrafal, Patrimônio Nacional de Cabo Verde,
pretende ser transformado, um dia, em Patrimônio da Humanidade.
Em julho deste ano o Ministro da Cultura de Cabo Verde foi
agraciado com o Premio Miguel Torga, tendo Mário Lúcio Sousa decidido doar o
valor da distinção (cinco mil euros) às obras de reabilitação do Campo do
Tarrafal. A transformação deste espaço no Museu da Resistência é um dos pontos
de um protocolo de cooperação na área cultural entre Cabo Verde e Portugal que
foi assinado este verão. Neste momento quem visita o Tarrafal fica a conhecer um
pouco da história dos presos políticos que lá viveram e também dos que por lá
acabaram por morrer. Fotos e ilustrações representam essas vidas, tal como as
paredes vazias do campo.
Por aqui não existem objetos de qualquer espécie, só
paredes, campos secos, e aqui e além, os restos das mensagens que ficaram dessa
época, para que ninguém se esqueça de que a liberdade é o nosso melhor bem.
Comentários
Enviar um comentário