Encontrar o Velho Espirito do Bairro Alto
Descobri, quase por acaso, a segunda loja mais antiga do
Bairro Alto.
Localizada na Rua da Rosa, o Atelier de Teresa Lacerda foi
inaugurado 20 dias antes do 25 de Abril, em 1974, numa altura em que o tempo se
parecia arrastar numa lentidão sem fim.
Nestes 44 anos muito aconteceu, o Bairro mudou muito e o
mundo mudou com ele. Normalmente vivemos mais durante a noite, esquecendo que
durante o dia existe por lá uma outra vida.
Neste sábado ao início da tarde, amena e brilhante para uma
tarde de inverno, percorri a pé as ruelas, descobrindo pequenas lojas de
comércio local, onde frutarias e mercearias mínimas convivem com lojas de autor
onde é possível descobrir peças únicas. Nas ruas, pouco movimento a contrastar
com o que se passa à noite. Cruzei-me com alguns turistas que desfrutavam do
bom tempo e um ou outro residente do bairro, na maioria idosos, que se
arrastavam com pequenos sacos, vindos da mercearia ou do café mais
próximo.
A Rua da Rosa é uma das ruas mais tradicionais, é aqui, no
nr. 167 que se descobre o mundo inteiro quando se entra no atelier. Mais do que
um espaço de criação e exposição de peças de arte, aqui, sem sair de Lisboa,
descobrimos um lugar onde se respira uma grande admiração e preocupação com
culturas muito ricas e que não podem ser esquecidas pela humanidade.
Prepare-se para viajar pelo mundo. Quando passa a grande
porta de madeira faz uma viagem no tempo e no espaço. Se olharmos com atenção
descobrimos detalhes que contam histórias vividas ao longo destes anos. Os anos
de grande movimento, onde o atelier era também um espaço de comercialização de
produtos únicos e exóticos como os tapetes que vinham do Afeganistão, o
mobiliário de mármore tão em voga na altura, as peças em bambu, o mobiliário
que chegava da India e do México e que era despejado de grande camiões, nesta
rua estreita mas solarenga, ainda se sentem no espaço, agora muito dominado por
peças de arte de grande influência africana.
Se olhar com atenção descobre pedaços destas pequenas
histórias e de muitas outras que Teresa Lacerda tem para contar. Descobriu a
arte dentro de si muito jovem, numa altura em que ser diferente era um luxo,
por isso, partiu para Londres, descobriu como o mundo era vasto e voltou para
abrir um espaço onde as pessoas seriam sempre o principal objeto de arte
retratado. Isso e os animais, muitos animais e em destaque muitos passarinhos.
A escultura e a pintura casaram e vivem felizes para sempre aqui. Reproduzem a
vida na representação de figuras vivas, humanas ou animais, criando um ambiente
onde se sente uma tranquilidade sem fim.
Teresa Lacerda tem também muitas histórias para contar, as
que se fundem com as paredes do espaço que é seu há tantos anos. Cresceu nos
arredores da grande capital num tempo em que arredores era sinonimo de campos
cheios de pequenas flores e foi possivelmente com avó que lhe contava histórias
da mitologia grega que aprendeu a sonhar com outros mundos e começou a modelar
o seu. O gosto de viajar apoderou-se da sua alma tendo descoberto novos mundos
lá fora, trazendo-os depois para Portugal. A Asia ficou-lhe com o coração e os
olhos sorriem quando fala na India, Vietnam, Cambodja e Tailandia e com certeza
se lembra de que ajudou a abrir em Portugal novas janelas para o mundo.
Aos jovens Teresa Lacerda deixa um conselho, o de irem para
fora, viajarem e descobrirem o mundo e depois e se lhes apetecer voltarem.
A todos deixo esta sugestão, descubram a beleza do Bairro
durante o dia, das janelas cheias de flores, das pessoas na sua lida, de
pequenos detalhes e sobretudo espaços como este, únicos, que merecem a nossa
atenção pois mais do que um local para comprar objetos, é uma bela história de
vida.
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